Bert
Você poderia andar pelo universo inteiro, procurar em todos os cantos e recantos, até virá-lo de ponta-cabeça, mas só iria encontrar aquele pequeno planeta em um lugar. Na Via Farinácea, no Sistema Bolar, o 3º planeta da direita para esquerda (ou de trás para frente, ou de baixo para cima). Era ele, uma bola rochosa, azul, com um terço de terra e o resto de água. O seu nome era Areia. Planeta Areia.
E, do mesmo modo, você poderia andar por todo o planeta Areia, percorrer todos os cantos e recantos, virá-lo de ponta-cabeça e girá-lo como um pião, que, ainda assim, só encontraria aquela cidade em um lugar. No continente E-médica, no país Pernil, a cidade de Santa Paula, curiosamente chamada de Santa-do-pau-oco.
Sim, não era um nome muito agradável, mas fazia jus à cidade, pois, do mesmo modo, você poderia andar por toda a cidade de Santa Paula, olhar em todos os cantos e recantos, virá-la de ponta cabeça (se tivesse força para tal), que não precisaria dar mais que um passo para fora da sua casa para encontrar ele. Aquele ser maligno, que se instalava em todas as ruas, ruelas, ruazinhas, ruazonas, avenidas, avenidinhas, avenidonas, pontes, pontezinhas e pontezonas, nas vias de pedregulho e terra batida, de mato e, até mesmo, acredite se quiser, de água.
Um monstro redondo e profundo, negro, que crescia a cada minuto, alimentado pela água da chuva e pelos caminhões e carros pesados. Entretanto, quem mais contribuía para isso eram os prefeitos da pobre cidade de Santa Paula; o dinheiro das obras públicas, duramente extorquido da população através de impostos, ao invés de ser dirigido para investimentos públicos, ia para rotas alternativas não muito públicas – pois, afinal, como um bom homem certa vez disse, nada mais misterioso e pessoal do que a bolsa de uma mulher, ainda mais se ela é uma política.
De qualquer forma, a cidade de Santa Paula, governada por uma tirana prefeita chamada Márcia, sofria com o mal parasitário. Ele havia sido expulso da Pseudoropa e dos países desenvolvidos, mas proliferava como praga nos país sub-desenvolvidos, entre eles, o pobre do Pernil. O nome desse mal era o assim conhecido Buraco.
Na verdade, não se sabe muito sobre a vida do buraco. Tudo que os cientistas esforçados da cidade de Santa Paula conseguiram descobrir era:
Primeiro: eles nascem de asfalto de baixa qualidade.
Segundo: não há data correta para seu nascimento, mas se sabe que, quando um buraco surge, é o suficiente para mais fazerem o mesmo, como fungos.
Terceiro: uma vez nascido, ele cresce assustadoramente.
Quarto: não há cura (por isso entenda: cura que os nossos impostos, previamente descontados para casamentos com pessoas de outro país, como Argelina, consigam cobrir), apenas uma contenção temporária, que pode cobrir os parasitas. Mas isso não significa que eles sumam de vez.
Em vista estes problemas, e vocês já alertas sobre os problemas que eles podem causar, a sua natureza e até mesmo a sua vida imortal, já posso lhes contar sobre um acontecido na cidade de Santa Paula.
Eis que uma vez, surgiu uma pequena fenda. Seu nome era Bert. E Bert, como toda boa e pequena fenda, cresceu e se desenvolveu de modo assustador, a ponto de todas as pessoas passarem, tropeçarem nele e dizerem: “Puxa vida, Bert, como você cresceu!”.
Quando alcançou seus dois anos de existência, o nosso pequeno Bert já não mais um simples Bert; ele já era um Bertão. E olhe que para se alimentar um Bertão, de comida se precisava de um montão!
Pois bem, Bertão alcançou as notáveis proporções de cinco metros de diâmetro por dez ou vinte de profundidade. Não se sabe como. O fato é que, certo dia, Bertão estava tão faminto que engoliu um carro.
As pessoas em volta olharam curiosas, tentando ajudar a vítima, de modo que surgiu até um pequeno verso:
“Era uma vez um buraco. Era uma vez um carrooo… Era uma vez um carro num buraco. E era uma vez um monte de pessoas. Era uma vez um buraco com um carro. Era uma vez um monte de pessoasss… Era uma vez um buraco com um carro e um monte de pessoas…”.
E assim ele ia, indefinidamente, contando a trágica sina das pessoas que se aventuravam dentro do Bertão. Os bombeiros tentaram ajudar, mas ele engoliu o caminhão e bebeu a água do hidrante, levando consigo os combatentes de fogo. Do mesmo modo foram o sorveteiro, o cara da banca, o entregador de leite, o contrabandista, o mendigo, três cachorros, quatro gatos, um grupo de símios, um aquário de peixes, todo o elenco dos Timpsons, famoso show de televisão, e até mesmo cinco sogras foram arremessadas.
Bertão tinha uma fome insaciável!
As autoridades foram chamadas, e devo dizer que, não sem vivas, a prefeita Márcia foi engolida pelo buraco, assim como um presidente de apelido Polvo e um político chamado Anéias, 57. Ah, como o negócio estava realmente feio, o ministro da fazenda, Palóqquio, entrou com um caminhão de 15, a Pirajununga, a famosa pinga do país Pernil.
Gostaria de poder dizer que tudo terminou bem, depois de uma festa de arromba e uma churrascada, mas, infelizmente, não foi bem assim (também, com cinco sogras juntas num buraco, devia mesmo é ser o inferno!).
Cordas foram arremessadas e as pessoas foram resgatadas. Os únicos que a população se recusou a resgatar foram os políticos e as sogras (não sei por quê…). E como promessa de político é o mesmo que esperar que um macaco descasque uma melancia, ninguém acreditou neles, e o pobre Bertão foi tapado com uma ripa de madeira, na eterna companhia dos políticos e sogras (eterna porque vaso ruim não quebra).
Bom, tudo bem, foi um final quase feliz. O único problema é que Bertão absorveu eles, de modo que, agora, para cada buraco na cidade de Santa Paula que surge, vêm junto cinco sogras e quatro políticos ladrões…
É, realmente, tem coisas das quais a gente nunca vai se livrar…

O Dr. David sempre sonhou em ser médico e, especialmente, em cuidar de crianças. Formou-se em medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, após dois anos trabalhando como médico generalista, onde pôde atuar próximo a famílias pobres e conhecer suas dificuldades e os diversos problemas do sistema de saúde brasileiro, começou a residência em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Leia mais