O caçador de zumbis
Estavam os dois sentados no bar. Ela tomava uma tequila. Ele, curiosamente, não tomava nada.
– Não bebo quando estou de serviço.
Ele era grande. Forte. Devia ser policial, ela pensou.
– Você é policial? – indagou, por fim.
Ele negou; não queria dizer o que fazia, ou, ao menos, fingia que não queria dizer. Ela insistiu bastante; no final, ele cedeu. Afinal, o que ele queria mesmo era falar logo de uma vez, mas estava fazendo charme.
– Sou um caçador de zumbis.
– Caçador de zumbis? – ela repetiu, sem acreditar. – Mas zumbis não existem!
– É porque estamos fazendo um bom trabalho.
– Sei… – ela respondeu, tomando um gole de sua tequila.
– Quer um exemplo? – ele falou, bem baixo. – O dono deste bar é um zumbi. E aqueles dois sentados ali também. Estavam apenas esperando você sair daqui para comê-la viva.
– Certo… Me comer viva… Sabe, isso não é uma coisa agradável de se dizer em um primeiro encontro.
– De fato. Mas você deu sorte de justo eu ter entrado aqui.
Ficaram em silêncio por um pouco. Ela lançou olhares furtivos para o barman; de fato, ele era meio pálido, tinha olheiras e os movimentos meio lentos e falava muito pouco. Por outro lado, era dono de um bar noturno, não se podia esperar muito mais dele.
Quanto aos outros dois sentados, também eram bastante esquisitos, mas estavam em paz. Lançaram olhares bizarros para ela, é verdade, talvez até mesmo famintos, mas estavam quietos.
Um sorriu para ela.
Devia ser a tequila.
Ela se levantou.
– Vou embora. Está tarde.
– Melhor não – o outro respondeu.
Os três homens do bar se ouriçaram e levantaram; ela realmente podia ver em seus olhos que estavam famintos. Quando deu por si, o barman já saltava por sobre o balcão; os outros dois vieram correndo, rápidos demais para os padrões zumbirescos, mas o caçador os derrubou com um par de tiros certeiros na cabeça.
Quando o barman já estava com as mãos quase no pescoço da moça, e ela já estava caída no chão, ele o acertou. O zumbi caiu para trás com um rombo no crânio.
Se não fosse em cima da hora, não teria graça.
O homem a ajudou a se levantar.
– Fique comigo. Posso protegê-la pelo resto da vida.
Ela olhou para os cadáveres dos não-mortos mortos, em seguida para a arma fumegante nas mãos do homem diante de si, e só se sentou para terminar a tequila.
Recusou a oferta.
Seria um relacionamento complicado, e a vida era muito mais fácil quando ela não sabia que zumbis existiam. Queria que continuasse assim.
Era só questão de evitar bares underground. E homens grandes.
Mas não a tequila.
Nota do autor, outubro de 2021: se tem uma coisa que eu nunca liguei muito é de histórias de zumbis. Tenho a impressão de que é sempre mais do mesmo, sabe? Daí, veio a ideia desta crônica – e se tem uma coisa que ela não é, é mais do mesmo!
O Dr. David sempre sonhou em ser médico e, especialmente, em cuidar de crianças. Formou-se em medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, após dois anos trabalhando como médico generalista, onde pôde atuar próximo a famílias pobres e conhecer suas dificuldades e os diversos problemas do sistema de saúde brasileiro, começou a residência em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Leia mais