O Experimento 113.435-B
No espaço sideral, orbitando ao redor da Terra, em uma nave espacial escura como o próprio universo, com espelhos defletores que impedem a detecção por qualquer tecnologia, humana ou não, uma equipe de alienígenas observa atentamente o pequeno planeta azul. Dois pesquisadores seguram o equivalente alienígena a uma prancheta, avaliando cuidadosamente uma série de telas gigantescas, que recobrem toda uma lateral da nave e estão repletas de dados, enquanto lançam olhares com seus olhos de camaleão, que giram independentemente e em 360 graus, para outras telas, que reproduzem a Terra.
– E então? – perguntou o primeiro.
– Experimento 113.435-B. Planeta Terra. Terceiro planeta do sistema Y-372-T, na Via Láctea – informou solicitamente o segundo.
– Nós tínhamos um experimento anterior por aqui, não?
– Sim. O 12.137-D. Conhecido como Marte, o quarto planeta.
– O que aconteceu com ele, mesmo?
– A atmosfera artificial parou de funcionar cinco milhões de anos atrás, e a superfície secou. Parece que os terráqueos estão doidos faz décadas, tentando descobrir se realmente tinha água ou vida lá.
O outro riu; adoravam fazer seus experimentos de bobos.
– E do jeito que vai, Andrômeda vai se chocar com a Via Láctea, antes que eles descubram!
Os dois gargalharam, fazendo um barulho que mais pareciam porcos grunhindo.
– Bom, enfim, o que temos aqui?
– O nosso primeiro contato foi alguns milhões de anos atrás. Os terráqueos ainda eram basicamente macacos que andavam em duas pernas. Se não me engano, os homo sapiens nem tinham surgido, ou ainda estavam para surgir…
– Certo. E o que nós introduzimos?
– Fogo. E depois de um tempo, como parece que não ajudou lá muita coisa, apesar de o cérebro deles ter crescido bastante, a roda. E a pedra lascada.
– Aí a coisa começou a andar.
– Sim, sim. Mas eles continuavam com dificuldades para falar. Ninguém sabia falar muito mais do que Ugh-Nugh.
– Diz para mim que introduzimos a linguagem! Diz! Diz!
– Exatamente.
– Aê! – exclamou o alienígena, feliz. Adorava quando introduziam a linguagem; as espécies davam um salto exponencial. – Fizemos o mesmo com os golfinhos, não?
– Ah, sim. Agora, eles dão um show nos mares e nos humanos idiotas que acham que os controlam.
– Hehe.
– Depois da linguagem, paramos de acompanhar os humanos por uns milhares de anos… E eles se desenvolveram bem. Nossos indicadores mostraram um salto importante nos últimos dois mil anos. Mas, não sei por quê, por um período de mil anos, eles regrediram muito.
– Faltou a nossa manutenção?
– É, a Federação Galáctica fez um corte de verbas, e ficamos umas centenas de anos sem poder passar por aqui.
– Certo…
– Mas, ao redor do ano T menos 500, fizemos algumas introduções importantes. Artistas, pensadores…
– Diga o nome de algum.
– Leonardo da Vinci. Pintou uma da nossa raça com o que eles acham que é um sorriso, que deixa todo mundo confuso até hoje, quinhentos anos depois. Martinho Lutero, que deu um chega para lá na hegemonia da igreja católica. E…
– Tudo bem, já entendi.
– Faz cento e cinquenta anos que não passamos por aqui. Pela última atualização, estavam na Revolução Industrial. Mas ainda tinha países com escravos.
– Aboliram a escravidão? – indagou o outro.
– Legalmente, sim. Na prática, em alguns lugares, não.
– Ah – ele respondeu, satisfeito. – Logo, logo, ela volta.
E estalou o dedo; imediatamente, um alienígena veio lhe trazer algo para beber, o que ele fez com satisfação através de sua tromba.
– Muito bem. E o que temos agora?
– Nossas análises da atmosfera mostram uma piora gritante da qualidade do ar. Realmente não sei como conseguem respirar lá. Estão queimando petróleo.
– E já está para acabar? Já está? – perguntou o líder, esperançoso.
– Ainda não. Eles ainda têm uns cinquenta anos.
– Ah… Eu adoro quando acaba, e eles ficam loucos.
– Mas estão desenvolvendo energias alternativas.
O outro pareceu profundamente chateado.
– A temperatura aumentou consideravelmente… Acabaram com boa parte das florestas, construíram estradas com asfalto…
– Asfalto?
– Piche sólido.
– Ah.
– Desenvolveram automóveis…
– Qual a velocidade máxima?
– 200 quilômetros por hora, na média.
– Fale em medidas que eu compreenda!
– 2,4 vezes 10 elevado a menos 3 unidades de luz.
– Que lesmas interestelares!
– Algumas aeronaves chegaram a velocidades até dez vezes maiores.
– Mesmo assim, lerdos. Nunca vão chegar ao hiperespaço. Acho que podemos definitivamente desconsiderar a possibilidade de eles saírem da Terra e nos atacarem nos próximos… Dois milhões de anos!
Os dois gargalharam novamente.
– Quer dizer, olhe para esta estação espacial. Meu filho tem brinquedos mais complicados do que isso!
Mais uma gargalhada.
– A medicina evoluiu bastante, mas ainda fazem cirurgias – adicionou o relator.
– O quê?
– Aquelas técnicas primitivas de abrir as pessoas com facas e costurar com fios.
O líder só não ficou enojado com a des-evolução disso, porque ele gostava de coisas bárbaras e sangrentas.
– Eles consideram que já estão no auge da sua civilização. E, pelas análises demográficas, eu realmente acho que atingiram um pico e logo mais…
– Enfim, resuma para mim – o líder falou, cortando o outro em sua fala. – Probabilidade de extinção de recursos naturais nos próximos cem anos?
– 95%.
– Probabilidade de desenvolvimento de técnicas sustentáveis a tempo?
– Se não fizermos nada, 0,01%.
– Probabilidade de terceira guerra mundial?
– 100%.
– Probabilidade de supercrescimento de uma praga incontrolável que vai aniquilá-los nos próximos 50 anos?
– 53,2% de chance de acabar com dois terços da população mundial.
– Aê! – o outro comemorou, novamente. – Expectativa de existência da raça humana?
– Se não fizermos nada, pelos cálculos do computador… 300 anos. Vão regredir para um estágio basicamente pré-histórico, não terão mais do que mil exemplares e… Se não fizermos nada… Provavelmente serão extintos e substituídos por golfinhos.
– É isso aí! E quais são as ordens da Federação Galáctica?
– Espere um pouco, estou enviando o relatório… Já chegou a resposta… Ahm… Não intervir por enquanto e retornar daqui a cinquenta anos.
– Cinquenta anos… Está certo. Dá para ver da seção 123.725 até a seção 125.002 neste meio tempo, antes de voltar. Muito bem, vamos embora, temos muito a ver ainda.
E, quando a nave estava manobrando para pegar impulso na órbita da Terra e partir, o líder pensou um pouco.
– Vamos… Dar uma coisa para eles se entreterem, vai. Jogue a cápsula de lixo espacial na atmosfera.
– Mas, chefe, você ouviu a Federação…
– Eles nunca vão saber. Ande logo!
E, enquanto a nave seguia em uma direção, uma pequena cápsula arredondada cruzou a atmosfera terrestre e entrou em combustão. Na Terra, cientistas ficaram excitadíssimos com um asteroide imprevisto que, embora minúsculo, não se desfez ao entrar em contato com a atmosfera, mas continuou seguindo, seguindo, até…
Cair na fenda mais profunda do oceano, que atingia mais de onze quilômetros de profundidade.
Mas tudo bem; eles mandariam suas máquinas e gastariam os próximos dez anos em uma expedição que iria descobrir uma cápsula espacial, contendo toalhas alienígenas sujas e um papel em língua universal dizendo: “Não entre em pânico”.
Nota do autor, outubro de 2021: e se realmente há uma raça alienígena muito mais avançada do que nós, apenas nos observando, fazendo experiências? E se realmente, para elas, nós somos apenas um grande Bigui Bróder?
O Dr. David sempre sonhou em ser médico e, especialmente, em cuidar de crianças. Formou-se em medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, após dois anos trabalhando como médico generalista, onde pôde atuar próximo a famílias pobres e conhecer suas dificuldades e os diversos problemas do sistema de saúde brasileiro, começou a residência em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Leia mais