A troca da torneira
Acho que não comentei com vocês que meu marido não é nem um pouco bom com estas coisas de casa, não é? Mal e mal ele consegue abrir um daqueles potes de vidro de doce de leite ou picles. Imaginem, então, a caca que não é ele pregando um prego.
Mas, como vocês sabem, todo homem acha que manja – e muito – dessas coisas de conserto de casa. Assim, um belo dia, quando meu marido chegou do serviço e eu já estava em casa, viu a torneira da pia pingando.
– Você viu que a torneira do tanque está pingando? – ele me perguntou.
– Vi. É melhor chamar o encanador.
– Mas até o cara vir, já vai ter vazado um monte de água!
E saiu testando para ver se conseguia fechar a torneira – e lógico que não conseguiu. A faxineira já tinha tentado, eu já tinha tentado, nenhuma das duas tinha conseguido, por que é que ele iria conseguir?
Bom, o segundo passo foi procurar o registro da cozinha; ele caçou, caçou, e finalmente achou uma daquelas chaves redondas de registro, fechou, mas não funcionou. Aí, ele foi tentar outro – mas também não funcionou. Sua última tentativa foi a do banheiro, que serviu – mas só para o banheiro.
– Bom, não tem jeito… – ele disse e fez o que todo homem recém-casado faz quando se encontra em situações difíceis. – Alô, pai?
Acontece que o pai dele é outro daqueles cabeças-dura. Mandou ele fazer exatamente o que ele já tinha feito.
– Não, deixa que eu vou aí, então, mais tarde. Você me ajuda, e a gente troca com o registro aberto, mesmo.
– Não, pai, não precisa – ele respondeu, querendo mostrar serviço. Afinal, já era um homem casado, ia ficar dependendo do pai para arrumar tudo? – Eu vou comprar a torneira e eu mesmo troco.
– Tá bom, mas qualquer coisa me liga.
E saiu como um doido para comprar a torneira, como se o mundo fosse acabar por causa daquela torneira pingando. Eu até tentei falar:
– Mas, Danilo, querido, trocar a torneira com o registro aberto é coisa de idiota, vai inundar a cozinha inteira…
– Mas meu pai falou que dá, é só você tampar o bocal, enquanto eu coloco a torneira.
Achei melhor não responder, para não decepcioná-lo…
Ele voltou encharcado de suor, ofegante – tinha ido praticamente correndo até a loja – e, triunfante, pegou a torneira e preparou tudo.
Ele tem uma caixa em casa que gosta de chamar de “caixa de ferramentas”. Não sei por que, já que não tem ferramenta nenhuma lá e não passa de uma caixa de sapatos com uma fita veda-rosca, uma fita isolante, uma lâmpada queimada, alguns parafusos e um espelho de tomada. Bom, ele pegou a tão idolatrada caixa, pegou a sua veda-rosca e ficou lá enrolando a torneira. Depois, era a hora da verdade.
– Você fica aí do lado e, quando a torneira soltar, você põe a mão.
Eu fiquei do lado por pura obrigação, mas lógico que não ia pôr a mão naquilo. Eu lá sou louca?
– Tem certeza que você não prefere pedir para desligar a água do prédio?
– Atrapalhar todo mundo só por causa de uma torneira? Imagina, Talita…
Como ele já sabia que ia se molhar, colocou só a bermuda do pijama e começou a desenroscar a torneira. E foi, foi, foi até que…
Eu tenho certeza de que vocês já assistiram ao filme do Titanic, aquele lá com a Kate Winslet e o Leo di Caprio. Lembram a cena de quando o navio afunda, e o capitão está na sua cabine? Sabem quando toda aquela água vem com tudo para cima dele? Então… Foi mais ou menos assim…
A água acertou ele em cheio e subiu, desceu, foi para os lados… Ele ficou gritando para eu colocar a mão, mas eu saí bem de fininho (digo, pulando, mesmo), e ele se virou sozinho. Bem que eu falei que era coisa de idiota! E o pior, quando ele finalmente conseguiu colocar a torneira nova e começou a enroscar, ela estava aberta, então ele teve de parar, fechar a torneira e aí, sim, continuar.
Uns quinhentos litros de água depois (tá, exagerei), ele conseguiu terminar a tarefa ridícula. Olhamos o resultado: a área de serviço, que a faxineira tinha acabado de limpar, estava encharcada. As coisas que ficavam no chão do pequeno depósito que temos de frente para a área de serviço também estavam ensopadas. Ele mesmo parecia que tinha acabado de sair do mar. Mas, por sorte, nenhum eletrodoméstico da cozinha se molhou.
E, lógico, depois de toda esta caca, quem que teve de ajudar ele a puxar a água?
Sempre sobra para a esposa…
Tivemos uma de nossas primeiras brigas por causa disso; e, no meio dela, quando parei para olhar aquela cena ridícula, comecei a rir – o que o irritou ainda mais! Por fim, ele começou a rir também, e ficamos os dois puxando a água como palhaços.
– Agora, já que você inundou tudo mesmo, por que você não troca a torneira da cozinha, também, que não fecha direito? – falei, só para provocar.
– E correr o risco de molhar todos os eletrodomésticos? – ele respondeu. – Eu não, tá louca? Da próxima vez, eu chamo um encanador, mesmo. E ele aproveita e troca o registro…
E até hoje eu me pergunto: por que ele não chamou um encanador desde o começo???
Mas, tudo bem, homens são assim mesmo…
Nota do autor, setembro de 2021: esta história é verídica. Aconteceu com o primo do amigo de um vizinho de um amigo meu.
O Dr. David sempre sonhou em ser médico e, especialmente, em cuidar de crianças. Formou-se em medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, após dois anos trabalhando como médico generalista, onde pôde atuar próximo a famílias pobres e conhecer suas dificuldades e os diversos problemas do sistema de saúde brasileiro, começou a residência em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Leia mais