Contatos Imediatos
– Vanusa, eu recebi um questionamento de uma leitora. Ela me mandou este vídeo aqui…
Ela interrompeu suas anotações no seu tablet intergaláctico para me encarar.
– Você recebeu um questionamento de uma leitora?
– Isso.
– Sério mesmo?
– É, o povo gosta de fazer perguntas para você.
– Não, não é isso que me surpreende, vocês são realmente muito curiosos. O que me surpreende é o fato de alguém ler o que você escreve.
Dei de ombros.
– Pois é, tem louco pra tudo.
Ela pegou meu celular.
– Mas sabe que toda vez que você fala algo assim, você me machuca… – murmurei.
– Vocês são muito frágeis – ela retrucou.
– Como é?
– Nada, não. Deixa eu ver esse vídeo… Calma, deixa eu entender, essa moça aqui tá falando que não tem por que pensar que, de tantos lugares no mundo, alienígenas iriam escolher justamente uma pessoa simples do Brasil para entrar em contato?
– Exatamente. A pergunta é: o que você acha disso?
– Que faz todo sentido. Quer dizer, com tanta gente importante no mundo, por que o nosso primeiro contato seria justamente com uma pessoa aleatória? Quer dizer, tem o Joe Biden, o Putin, o cara lá da China que eu sempre erro o nome, tinha a Rainha Elizabeth, descanse em paz… Por que eu iria escolher uma pessoa aleatória da Terra?
Eu sorri e senti meu peito inflar, conforme preparava a pergunta certeira:
– Quer dizer então que eu não sou uma pessoa aleatória da Terra? Eu sou… Importante?
Ela riu e deu tapinhas carinhosos na minha cabeça.
– Tolinho.
– O que foi?
– No meu trabalho como antropóloga espacial, eu preciso estudar contrastes – ela disse. – É isso que traz o colorido ao meu trabalho, às minhas teses.
– Contrastes? – perguntei, em seco.
– Justamente. Já entrevistei os grandes líderes. Já falei com Obama, Bill Gates, Madonna, reis, rainhas… Já tive contato com, sei lá, umas duas, três mil pessoas de sucesso.
– Sei…
– E, agora, bem, agora estou na fase das pessoas comuns. Pobres coitados sem sucesso algum, sofrendo para se tornarem pessoas de sucesso, mas sem um pingo de perspectiva.
Eu murchei e desabei na cadeira.
– Mas, ei, não se abale – disse ela, dando um soquinho no meu queixo em um estilo certamente copiado de um filme. – Eu acredito em você. Acho que você pode ser tipo, sei lá, o Rocky, sabe?
– É?
– Sim, claro. Mas sem a montagem do treino, porque você não é um lutador, você é um… – ela parou. – O que você é mesmo?
– Médico? Escritor? Pai de família? Empresário? Alguma dessas conta?
– Quem é tudo não é nada, dizem por aí – murmurou ela.
– Como é?
– Tente tudo para não ser nada! – exclamou ela. – É isso. Eu acredito em você. Você é um exemplo de superação, e é por isso que eu estou te seguindo e mantendo nossas conversas.
– Sei… – falei, desconfiado.
– Agora…
De repente, a tela dela começou a brilhar.
– Ah, desculpe, a Kim precisa de ajuda.
– Kim?
– Kardashian. Somos amicíssimas. Tchau!
E desapareceu na minha frente.
Mas o golpe na minha autoestima ficou.
Vou tentar colocar uma música do Rocky. Quem sabe, ajuda?

O Dr. David sempre sonhou em ser médico e, especialmente, em cuidar de crianças. Formou-se em medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, após dois anos trabalhando como médico generalista, onde pôde atuar próximo a famílias pobres e conhecer suas dificuldades e os diversos problemas do sistema de saúde brasileiro, começou a residência em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Leia mais