Implantes Militares
– Então, por que essa obsessão fálica?
Vanusa apareceu enquanto eu esperava um paciente que estava atrasado. Ela estava, desta vez, com uma enorme caneca amarela, escrito: “Não, eu não tenho um mamilo”. Eu a encarei.
– Fã de Friends?
– Adoro! – exclamou ela.
– Precisa ser fã de verdade para entender a referência.
Ela deu de ombros.
– É para os fortes. Mas, sério, por que a obsessão fálica?
– Eu imagino que você esteja falando das notícias do governo, dos implantes penianos e das pílulas de Viagra, certo?
– Exatamente! Por isso que eu gosto de você, você pega quase todas as referências!
Quais eu não pegava?
– Bem, eu não sei muito bem por que a obsessão fálica, Vanusa. Mas, a questão é que este tema foi mais um de bandeja para o país da piada pronta que é o Brasil.
– Como assim?
– Bom, eu sinceramente não sei quanto gastam com esse tipo de coisa para as forças armadas…
– Forças armadas – disse ela, dando risadinhas. – Pegou?
– É, sem elas, talvez fiquem desarmadas.
Ela riu.
– De qualquer forma, as pessoas esquecem que impotência sexual é, de fato, um problema de saúde. E, se nós temos um sistema de saúde que trata todos de forma universal e integral, eles vão gastar dinheiro com isso. Aliás, Vanusa, sabia que se você se acidentar, você vai ser atendida por um hospital do SUS? E se morar no Brasil, vai ser atendida também em unidades básicas de saúde e tudo mais?
– Ah, é?
– É, o sistema é universal, mesmo. Até alienígenas entram!
– Bom saber – ela respondeu, tomando da sua caneca. – Mas vocês não saberiam me tratar. E não fuja do assunto!
– De qualquer forma… Hoje em dia, qualquer coisa é motivo para criar furdunço e controvérsia. Como eu estava falando, se o sistema vai tratar tudo, ele logicamente vai cuidar disso também. As pessoas podem dizer que é besteira e tal, mas isso faz parte da qualidade de vida, da mesma forma que, por exemplo, procedimentos estéticos!
– Mas, acho que a revolta popular talvez seja contra a quantidade de produtos adquiridos, não? Alguma preocupação com corrupção?
– Isso eu já não sei dizer, mas aqui é o Brasil, isso sempre é possível. Como eu falei, não sei o tamanho das formas desarmadas, desculpe, não podia perder o trocadalho do carilho, literalmente, então, não sei se o número foi compatível ou não. A forma de saber é ver compras anteriores e se está mantendo o padrão; outra forma é avaliar dispensações e implantações dos produtos. Enfim.
– Algo meio pentelho, não?
– Esse negócio de segundo sentido já está ficando chato.
– É que você levanta a bola, eu tenho de…
– Tá bom! – exclamei. – Olha, meu paciente chegou, preciso atender.
– Mas, você ainda não me respondeu o motivo dessa obsessão fálica.
– Isso nem Freud explica, Van-van.
– Ah, tá bom. Vou perguntar para ele – ela respondeu e desapareceu.
Perguntar para o Freud? Sério, certeza de que ela fala essas coisas só para me enganar. Tudo blefe para eu achar que eles são melhores que a gente.
Assim espero.
O Dr. David sempre sonhou em ser médico e, especialmente, em cuidar de crianças. Formou-se em medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, após dois anos trabalhando como médico generalista, onde pôde atuar próximo a famílias pobres e conhecer suas dificuldades e os diversos problemas do sistema de saúde brasileiro, começou a residência em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Leia mais