São fáceis porque são pobres?
– Eu estava estudando a prostituição.
– No sentido metafórico? – perguntei, sem compreender.
– Não, no real.
– Mas… Você… Está precisando de dinheiro? Eu tenho certeza de que tem formas melhores de uma Venusiana ganhar a vida…
– Não! – ela exclamou. – Por Darwin, que ideia é essa? Que coisa nojenta!
Parei o que estava escrevendo para pensar: venusianos fazem sexo?
– Não, isso é coisa de seres primitivos!
Ela consegue ler meus pensamentos agora?
– Só quando você fala besteira.
– Para com isso! – exclamei. – Preciso usar um chapéu de papel alumínio?
– Não serve para nada, mas seria engraçado.
Bufei.
– Mas, como vocês se reproduzem, então?
– Estamos fugindo do foco. Eu estava falando sobre prostituição.
– Certo.
– É uma das profissões mais antigas da Terra.
– Reza a lenda que sim.
– Sabe que macacos fazem algo do tipo, não é? Trocam relações sexuais por outros favores.
– A gente tinha que puxar isso de algum ser, né?
– Mas, o negócio ficou malvisto por causa da igreja, correto?
– Olha, eu não sou um profundo conhecedor da prostituição… – respondi. Lá vinha ela. Às vezes, eu tinha a sensação de que era somente um pano de fundo para os seus monólogos. – Aonde você quer chegar, Vanusa?
– O comentário daquele Deputado Estadual. Sobre as ucranianas.
– Sim, comentário ridículo, o dele. As pessoas perderam a noção. Bom, se bem que, na verdade, acho que elas sempre falaram essas coisas, só que, agora, a gente tem tudo registrado. Imagine, para cada pessoa que fala isso, quantas outras tem falando baboseiras misóginas e machistas por aí? Ainda temos muito a evoluir.
– Mas, nós temos evidências claras no mundo que a prostituição se associa à pobreza. De fato, mulheres pobres se prostituem por dinheiro! – exclamou ela, ouriçada.
– Isso é verdade, Vanusa, mas do jeito que ele falou, leva a crer que todas as ucranianas ganham a vida assim, por ser um país pobre.
– Ah. Entendi.
Ficamos em silêncio por um pouco.
– Mas, as pessoas não podem ganhar a vida assim?
– A pessoa pode ganhar a vida com o que quiser, contanto que seja lícito.
– Vocês são muito interessantes.
Eu a encarei.
– Vocês realmente não fazem isso?
– Não. É nojento demais, só de imaginar, toda essa troca de fluidos…
– Vocês não têm bebês, então?
– Nós… Ah, nem vem, não vou cair nesse seu joguinho – ela falou, apontando os dedos para mim, e desapareceu em pleno ar.
Deve ser bom fugir de discussões assim. Eu também gostaria de poder ficar invisível, ou me teletransportar, ou fazer fosse lá o que fosse que ela fazia.
Agora, onde eu estava mesmo com a minha ideia? Droga. Mais uma crônica que a Vanusa me atrapalha…

O Dr. David sempre sonhou em ser médico e, especialmente, em cuidar de crianças. Formou-se em medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e, após dois anos trabalhando como médico generalista, onde pôde atuar próximo a famílias pobres e conhecer suas dificuldades e os diversos problemas do sistema de saúde brasileiro, começou a residência em Ortopedia e Traumatologia pelo Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Leia mais